As minhas faces
Observo a caixa onde o último charuto descansa
Há uma certa elegância no aroma do Cohiba
Ainda pousa sobre amarelados papéis
a caneta de pena importada
o relógio de bolso em ouro
(ambos herança de meu avô)
já desfiz-me de tudo que era precioso
perdi-me de muitos rostos caros e amigos
e morri um pouco em cada mulher que amei
hoje o tom escuro repousa em quase todas minhas roupas
e meu peito e braços são de cinzas e barro
sou feito de cinzas e barro
e toda essa profusão de sons, cores, pessoas
são estranhas ao meu olhar.
Relembro na pausa de um suspiro (lento)
Toda minha vida
pouca coisa restou de uma época e de mim.
Os últimos poemas ainda insistem na memória
Eles tem a alma, o ritmo e o segredo dos mares
E toda noite, condenam-me veemente
ostentando sobre as ondas, brados revoltos
em espumas claras-intensa-reluzente
A face de todos meus “eus” mortos
Tonho França
31 de mai. de 2010
20 de mai. de 2010
A morte
A morte em minha casa
Vive no branco da parede
Adornada por azulejos
Brancos e azuis-pálidos
Alimentando-se de mim
Num ritual contínuo e natural
Com o apetite voraz dos ponteiros
Que contemplam vitoriosos
cantando eternos tic-tacs
Tonho França
Vive no branco da parede
Adornada por azulejos
Brancos e azuis-pálidos
Alimentando-se de mim
Num ritual contínuo e natural
Com o apetite voraz dos ponteiros
Que contemplam vitoriosos
cantando eternos tic-tacs
Tonho França
18 de mai. de 2010
A moça...
A moça ...
Tinha os olhos e cabelos formados por feixes de águas negras e profundas
A pele morena e lisa em tom de terra secular e misteriosa
Lábios finos e doces como o sumo dos morangos
Sua voz era a mesma das deusas e das prostitutas de todos os tempos
E guiava o vôo dos pássaros e o rumo do sol
O vestido de neve rendado por pedras e ervas
cobria o corpo bordado em fios de ouro e pérolas
Era a moça de Santa Cruz de La Sierra
Era a moça de Santa Cruz
Na mão direita estampada a face de vários mortos
E na outra um cajado de lua e estrela
Os seios erguidos apontavam o céu
E amamentavam pequenos anjos que nasciam nas noites de inverno
Não era amante de homem nenhum ou de qualquer criatura
Os pés descalços pisavam o tempo e as promessas
Suas lágrimas banhavam os vales em trigo e vinho
E era do seu sopro que nasciam os sonhos de todos os homens
Por todos os dias e noites num tecer que não se encerra
Era a moça de santa cruz de La sierra
Era a moça de santa cruz
Era a santa
Ela a cruz
Tonho França
Tinha os olhos e cabelos formados por feixes de águas negras e profundas
A pele morena e lisa em tom de terra secular e misteriosa
Lábios finos e doces como o sumo dos morangos
Sua voz era a mesma das deusas e das prostitutas de todos os tempos
E guiava o vôo dos pássaros e o rumo do sol
O vestido de neve rendado por pedras e ervas
cobria o corpo bordado em fios de ouro e pérolas
Era a moça de Santa Cruz de La Sierra
Era a moça de Santa Cruz
Na mão direita estampada a face de vários mortos
E na outra um cajado de lua e estrela
Os seios erguidos apontavam o céu
E amamentavam pequenos anjos que nasciam nas noites de inverno
Não era amante de homem nenhum ou de qualquer criatura
Os pés descalços pisavam o tempo e as promessas
Suas lágrimas banhavam os vales em trigo e vinho
E era do seu sopro que nasciam os sonhos de todos os homens
Por todos os dias e noites num tecer que não se encerra
Era a moça de santa cruz de La sierra
Era a moça de santa cruz
Era a santa
Ela a cruz
Tonho França
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